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Paulo Coelho

Na minha adolescência sempre li muito. E escrevi mais ainda! Idades conturbadas, sedentas de respostas, novas experiências, novas influências e liberdade para as absorver… Digamos que tive pouco espaço, ou nenhum, o que limitou as vivências ao que lia e escrevia.

Do muito que li, recordo com algum carinho os livros do Paulo Coelho. Livros que lia em busca de uma luz ao fundo do túnel, em busca de uma fé, de uma resposta para as questões sem resposta, de um Norte…

Não posso dizer que encontrei resposta para todas as questões que me atormentavam, mas sem dúvida senti alguma empatia, algum conforto nos livros do Paulo. Por vezes chegava a ser estranho… Se tinha uma dúvida existencial, daquelas que só são pertinentes e prementes na intensidade da adolescência, encontrava as mesmas dúvidas e as mesmas teorias e ilações nos livros do Paulo - Tinha encontrado a minha alma-gémea!

Por isso, quando vi o desafio deste mês no blog “De Cozinha em Cozinha passando pela minha” o primeiro escritor contemporâneo que me ocorreu convidar para jantar foi o Paulo Coelho… Este projecto foi criado pela Ana do blog Anasbageri e pena é, Ana, que estes convites sejam apenas virtuais… Porque sem dúvida que teria muito gosto de conversar com o Paulo…

Bem… Como sei que o Paulo gosta de comida marroquina, resolvi servir umas espetadas de frango com uma salada fresca de grão. E, à hora marcada, lá chegou ele, de ar afável, de sorriso fácil, cheio de histórias e vivências para partilhar.

Confesso que me senti intimidada, sentado ali ao meu lado, numa mesa na varanda que dá para o Jardim, estava um homem que vendeu mais de 100 milhões de livros em mais de 150 países, tendo as suas obras traduzidas em 66 idiomas*! E eu sedenta de lhe dizer, entre uma garfada e outra, o quanto foi uma referência para mim enquanto crescia. Queria tanto dizer-lhe o quanto o seu livro “Veronika decide morrer” me marcou e mudou como pessoa, queria tanto trocar impressões sobre a sua adolescência incompreendida e crescimento conturbado… Sentimentos, aliás, partilhados.

Felizmente ele percebeu o meu pouco à vontade e perguntou “Qual o livro de que mais gostas e porquê?”

Eu respondi “Sabe que Veronika decide morrer no meu dia de anos?”

A partir desse momento a conversa fluiu como se fôssemos velhos conhecidos, com um copo de chá de menta na mão, reflectindo sobre a consciência da morte, como um incentivo à própria vida. Sobre o quanto o livro “Veronika decide morrer” nos obriga a olhar para dentro de nós próprios, a repensar o rumo da nossa existência, a perceber o quão ténue é a linha que separa a sanidade da insanidade.

Recordo de algumas passagens do livro: “Acreditava ser uma pessoa absolutamente normal. A sua decisão de morrer devia-se a duas razões muito simples, e tinha a certeza de que, se deixasse um bilhete a explicá-las, muita gente ia concordar com ela. A primeira razão: tudo na sua vida era igual e uma vez passada a adolescência, seria a decadência, a velhice começaria a deixar marcas irreversíveis, as doenças chegariam, os amigos partiriam. Enfim, continuar a viver não acrescentava nada, pelo contrário, as possibilidades de sofrimento aumentavam muito. A segunda razão era mais filosófica: Veronika lia jornais, via televisão e estava a par do que se passava no mundo. Tudo estava errado e ela não tinha como reparar aquela situação – o que lhe dava uma sensação de inutilidade total. […] Não era por ausência de amor que se matava. Não era por falta de carinho da sua família, nem problemas financeiros, ou por uma doença incurável. […] Um suicidio exige que as pessoas pensem primeiro em si mesmas e depois nos outros.”

Se estas reflexões não nos fazem pensar, o que fará? Quando deixámos de dar valor às pequenas coisas? Quando deixámos de sonhar, de sorrir, de ser optimistas? O que nos motiva a continuar? O que nos leva a sentirmo-nos apenas mais um? O que nos impede de deixarmos a nossa marca?

Foi boa a reflexão, em jeito de conversa… O jantar foi só um pretexto ideal, num final de tarde de Primavera… Num revisitar de períodos conturbados, um voltar a questões incómodas, a um olhar bem dentro de nós mesmos!

Percebo agora porque é um escritor que não reúne consenso entre os seus pares… Um escritor que escreve de coração aberto, sem grilhões, sem rodeios. De linguagem acessível, consegue chegar bem ao fundo das questões, bem longe na nossa essência enquanto pessoas.

Há pessoas que nos marcam… No meu caso, o Paulo Coelho foi uma delas! Foi um enorme prazer recebê-lo na minha humilde casa e partilhar com ele parte de mim, experiências, vivências, reflexões… Afinal, tudo do que a vida é feita!

* informação retirada da Wikipédia.

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Espetadas de frango com salada marroquina de grão

[serve 4]




Ingredientes:




Para as espetadas:

- 2 peitos de frango cortados em cubos

- 1 iogurte natural/grego

- 1 colher de chá de ras-el-hanout**

- 1 colher de café de paprika

- 1 colher de chá de canela em pó

- 2 folhas de louro

- 1 alho

- 2 folhas de hortelã

- sal qb

- paus de loureiro ou de alecrim (usei de alecrim)




Para a salada:

- 400 gr de grão de bico cozido

- ½ pimento vermelho

- 1 pepino

- ½ cebola picada

- uma mão cheia de tomates cereja

- uma mão cheia de azeitonas

- 3 hastes de coentros

- 1 haste de aneto

- 4 folhas de hortelã

- raspa de 1 limão

- 1 iogurte natural/grego

- 2 colheres de sopa de sumo de limão

- 1 colher de sopa de azeite

** tempero marroquino que significa "o dono da loja" e que não é mais do que a melhor mistura de especiarias que o dono da loja pode oferecer. Existem tantas misturas quanto as pessoas que as combinam/vendem, mas normalmente inclui cardamomo, cravo, canela, pimenta, coentros, cominhos, noz-moscada e açafrão.




Preparação:


Faça uma marinada com todos os temperos e o iogurte e coloque os cubos de frango durante cerca de 1 hora a marinar.

Espete o frango nos paus e leve ao grelhador bem quente. Sirva as espetadas com a salada de grão temperada com o molho de iogurte.

Prepare a salada. Coloque numa saladeira o grão-de-bico, o pimento vermelho e o pepino cortados em cubos pequenos, os tomates e as azeitonas e a cebola picadinha. Faça um molho com o iogurte, os coentros, o aneto e a hortelã picados muidinhos, a raspa e o sumo de limão e o azeite. Tempere de sal qb. Misture bem e leve ao frio até ao momento de servir.

Sirva a salada regada com o molho de iogurte a acompanhar as espetadas e acompanhe a refeição com um chá de menta marroquino.

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Comentários

  1. Paulo Coelho também foi um companheio de adolescência. São fases conturbadas, como bem dizes, em que as perguntas são mais que muitas e as respostas parece que escasseiam, mas hoje quendo revejo esses tempos também acho que são os momentos mais claros das nossas vidas. Os sentimentos são intensos, nascem lealdades profundas. A amizade e o amor marcam as horas dos dias. De vez em quando, nós adultos, deveriamos fazer uma viagem de um dia à nossa adolescência, de certeza que muitos dos problemas que criamos deixariam de fazer sentido.
    Obrigada pela tua participação, foi um belo jantar.
    Beijinhos

    ResponderEliminar
  2. Carla é muito bom sentirmos empatia para com a nossa historia. E estas certa, apesar de nunca ter pensado nisso, nunca tive momentos tão claros na minha vida... Devíamos todos fazer este tipo de regresso ao passado de quando em vez... Com certeza seriamos pessoas melhores, mais conscientes. Foi um enorme prazer ter participado. Foi a minha primeira participação e tenho muito orgulho que tenha sido no teu blog de que gosto muito.

    ResponderEliminar

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